• Uma entrevista sobre Verdades e Solos
  • Resenha de “Céu Subterrâneo” no Jornal da USP
  • A verdade lançada ao solo, de Paulo Rosenbaum. Rio de Janeiro: Editora Record, 2010. Por Regina Igel / University of Maryland, College Park
  • Resenha de “Céu Subterrâneo” por Reuven Faingold (Estadão)
  • Escritor de deserto – Céu Subterrâneo (Estadão)
  • A inconcebível Jerusalém (Estadão)
  • O midrash brasileiro “Céu subterrâneo”[1], o sefer de “A Verdade ao Solo” e o reino das diáforas de “A Pele que nos Divide”.(Blog Estadão)

Paulo Rosenbaum

~ Escritor e Médico-Writer and physician

Paulo Rosenbaum

Arquivos de Categoria: Na Mídia

Minha folia é você (Estadão)

13 sábado abr 2019

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Minha folia é você

Paulo Rosenbaum

13 fevereiro 2015 | 13:35

folia

Minha folia é você

Minha folia é você

No momento,  fica

Não prometo nada

E se disserem sosseguem,

Negaremos

A folia transita num violino

Compromissadamente perdido

Comprovadamente visível

Concomitantemente relapso

A folia está nas nuvens,

Nas milhas náuticas

Nos pulsos indomáveis

Que esquecem tudo, juntos

Num particular anticarnaval

Nesse mar sem muros

Na fome da entrega

Toda e qualquer latitude

Deita folia em teu corpo.

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O que não vimos ? (Estadão)

13 sábado abr 2019

Posted by Paulo Rosenbaum in Artigos, Imprensa, Na Mídia

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O que não vimosX

Não vimos barcos, nem velas

no horizonte, chão espesso,

nem piso, nem recomeço

Não vimos volta

 do exílio, iminente

as salvaguardas, fluídas

No isqueiro, imenso

Não vimos a censura,

de revista em revista

nos privar da leitura

Não vimos calçadas,

E, perdendo o átomo,

Miramos o concreto

a matéria, o minério

Não vimos tempestade, nem areia,

enquanto sonhos se revezavam,

as provas, robustas,

o tirano acuado

mas, no rito do impedimento

migramos de volta ao relento

Enxerguemos no tempo,

 dobra do espaço,

obliqua janela,

notável advento,

a indecifrável rota

que finda o tormento.

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O tão aspirado nunca mais. (Estadão)

13 sábado abr 2019

Posted by Paulo Rosenbaum in Artigos, Imprensa, Na Mídia

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A Shoah, holocausto, Nunca mais

O tão aspirado “nunca mais”

Já que podemos evocar a memória de acordo com nosso desejo, preferimos dispensar as tragédias, a morte e a destruição. Segundo os biólogos evolucionistas trata-se de uma adaptação. Não suportaríamos ter que conviver com o amontoado de frustrações, negativas, impedimentos, injustiças, o mal feito, o espúrio, o inacabado, a imperfeição, o desprezo, as circunstâncias constrangedoras, os desvios, a insuficiência, as urdiduras da perfídia, o triunfo da malignidade. Mas, e se um pouco de dor, de luto e de sofrimento funcionasse como um antídoto para toda essa mania?  E se conseguissemos nos colocar, no sentido de transferencia absoluta, no lugar do outro? E se ficássemos entregues — que seja uma vez ao ano — à memória dos mal sucedidos, dos perdedores, dos sofredores, da silente agonia dos sem voz, dos invisíveis?

Apontar e erigir monumentos às vitimas do mal feito é uma forma de fixar o insuportável em nossa tendencia à negação.

Um regime político pode exterminar de muitas formas, a mais eficaz contudo — e a história prova a tese — é através do populismo e do culto à personalidade. Exemplo atual é o perfil daqueles que nos prometeram justiça, igualdade de oportunidades e bem estar e, em apenas 13 anos, nos entregaram o País falido. A deseleição ocorre quando há mais deméritos no oponente do que méritos no rival. Foi apenas um espasmo de legítima defesa em meio à inércia, à falta de articulação, à inexistencia de oposição, e hoje, perplexos, nem nos perguntamos mais o que pensar daqueles que persistiriam no erro. Hoje representados por quem torce e milita contra. Evidentemente, para além da habitual desonestidade intelectual, trata-se de histeria anti-republicana, sobretudo guiada pelo velho e cansativo ranço ideológico.

O dia H é o dia da memória das vítimas do holocausto, mas poderia ser expandido para outras vítimas, igualmente criminosas, como as pessoas incineradas na Boite Kiss, nos arrastados em Mariana, em Brumadinho, em Teresópolis, em Angra, nas demais encostas abandonadas do Brasil, nos viadutos que despencam, nas passarelas precárias, nos trilhões sepultados em obras inexistentes. E, também, de todos os extermínios pequenos, médios ou grandes. Aqueles que confiam no Estado todo protetor ainda não sabem que há, bem aqui entre nós uma loucura muito particular: ela impede a compreensão do valor da vida. Nesta insanidade obnubiladora movida à matéria e arrogância está o germe do terror.

Não é só do terrorista comum, estes inimigos da humanidade, que preferem que a causa preceda a sobrevivência e o bem estar. Mas também, e principalmente, o usurpador, aquele que amadurece no trono e não quer mais larga-lo, dos tiranos que se escondem sob slogans e verbetes de ocasião. Se há culpa? Sim acumulada. Sim retida nos decretos. De vários partidos e instituições. Nos alvarás. Nas leis. Exato, assim como as leis raciais de Nuremberg, as vezes o crime tem chancela oficial, é do Governo que passa a usurpar o Estado.

Na Alemanha nacional socialista também foi assim. As legiões que acreditam em correntes ideológicas acima do pensar, da direita à esquerda, ainda existem. Geralmente são aqueles que prometem resgatar nações e promovem genocídios. Contam com o descaso, acreditam na amnésia induzida. Apoiam-se no esquecimento e na prescrição. Sabem que a qualquer momento podem queimar livros, perseguir minorias, mas especialmente imaginam que o sufragio lhes da o direito de pulverizar a memória. Em suas agendas já está registrado: “as manchetes se calam em três semanas”.  Mal sabem que a memória contém um compartimento secreto. A “segunda mente” na definição de Charcot. E ela é surpreendente, capaz de desaguar seu manancial quando menos se espera.

Freud em seu polêmico livro “Moisés e o Monoteísmo” conta que o que mais o impressionou no povo judeu era uma espécie de persistência quase irracional diante das adversidades. Cita o famoso caso de um dos sábios talmúdicos. Enquanto o Templo de Jerusalém ardia em chamas incinerado pelo exército romano, e quase um milhão de vidas haviam sido ceifadas pela espada, foi ter com o temível governador geral da Judeia que sonhava exterminar os judeus e fundar Aelia Capitolina. Vários tentaram dissuadi-lo da empreitada que poderia lhe custar  a vida. Inúltil. Ele seguiu e foi para até o tirano pedir autorização para transferir seus estudos para um outro local. Ora, por que? Perguntava-se o intrigado médico. Seguir adiante. Alguns chamam de pragmatismo. Outros classificariam de estoicismo patológico. Porém, ao fim e ao cabo, poderia apenas simbolizar um apesar de tudo, apesar de todos, escolher-se vida.

Pois esse espírito afirma que a humanidade pode seguir até um lugar onde cada um poderá ter tempo para se estudar, para sempre.

Quiça assim, e só assim, o tão aspirado “nunca mais” superará o eterno retorno.

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Haverá outro código para a Medicina?(Estadão)

13 sábado abr 2019

Posted by Paulo Rosenbaum in Amazon, Artigos, Imprensa, Na Mídia, O outro código da Medicina (e book) homeopatia, Pesquisa médica

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medicina integrativa, Outro código da Medicina, Samuel Hahnemann

Haverá outro código para a Medicina ?*

10 de abril – data de nascimento de Samuel Hahnemann

O que é um código? Pode ser uma coleção metódica e sistemática de leis, uma coleção de regras sistemáticas de procedimento e conduta, ou um sistema de sinais secretos ou convencionais usados no comércio e na literatura. O título deste livro insinua que pode haver mais de uma compreensão para a medicina, pode haver mais de um código de procedimento e conduta para compreeender saúde e enfermidade. E um não exclue necessariamente o outro. Vários códigos podem conviver e ser simultâneamente usados, sem que um tenha supremacia sobre o outro.

O público que consome livros científicos conhece pouco de medicina preventiva e tem noções muito vagas sobre as medicinas integrativas.  O conceito popular é de que a prevenção não é solução e de que uma medicina menos invasiva como as técnicas das medicinas integrativas pairam aspectos polêmicos. A verdade é que a grande maioria deste público as conhecem apenas superficialmente. Poucos a conhecem como uma medicina que cuida de sujeitos. Outros, não têm a menor idéia de sua abrangente capacidade de atuação que vai dos doentes com patologias severas às pessoas com problemas clínicos sem diagnóstico definido. Enfim que a prevenção pode atuar no indefinível estado chamado de “mal estar”. Este “mal estar” (illness) indevidamente pouco valorizado, também é muito importante na medicina pois aparece muito antes de que a patologia (disease), a doença propriamente dita se organize e apareça na forma de sinais e sintomas. O que menos gente sabe ainda é que a homeopatia interfere em todas estas áreas levando em consideração também o estado de saúde.

E por que o grande público sabe tão pouco sobre ela ou a conhece de forma tão estereotipada?

A homeopatia por exemplo é uma medicina sobrevivente. As provas são sua longa permanência na adversidade e sua lenta, porém sustentada expansão. As referências são escassas em todo tipo de mídia, especialmente quanto aos seus aspectos efetivamente mais interessantes. A omissão crônica do verdadeiro alcance da homeopatia também explica e justifica sua baixa visibilidade.

A homeopatia pode ser definida como um sistema terapêutico de interferência médica baseada em similitude e observação clínica que usa a individualização dos sintomas como sua principal fonte de conhecimento. Trata-se de uma prática médica que ouve estórias, acolhe narrativas e interpreta biografias.Não é fortuito que estejam nascendo movimentos como “Medicina Baseada em Narrativas”, “Medicina sem Pressa”, “Medicina Baseada em Empatia”, “Hermenêutica Médica”

Em “Céu Subterrâneo”,  (romance publicado em 2016 pela editora Perspectiva) trago uma referencia da “História dos Animais” de Aristóteles. Numa determinada passagem ele escreve sobre a memória. Por um erro de interpretação conhecemos a famosa versão de que o homem seria racional em oposição aos animais que estariam descritos como irracionais. Para o filósofo no entanto, a verdadeira distinção seria outra, e está em outra passagem deste mesmo livro: o que nos diferencia dos outros animais não seria a possibilidade de raciocinar pois é evidente que os animais também o fazem. Para o pensador, a grande distinção estaria na capacidade humana para evocar a memória conforme sua vontade. E narra-la.

Cito isso para lembrar que Prof. Walter E. Maffei, importante pesquisador e neuropatologista brasileiro e um dos meus principais mestres. Maffei ilustrava uma de suas aulas na Faculdade de Medicina projetando imagens de gatos. Por que? Afirmava, com razão, que aqueles que tinham as predisposições alérgicas despertada por alguma idiossincrasia, poderiam apresenta-las apenas com a “lembrança” desta experiência. Não seria necessária a presença física de um gato, poderia bastar imaginar à exposição a algum alergeno que não estivesse presente para “excitar” instantaneamente um quadro alérgico. A lembrança de alguém que apresenta sensibilidade ao pelo deste animal poderia desencadear um início de manifestação alérgica. Esse exemplo evidencia pelos menos duas coisas, a incrível sensibilidade do psiquismo e o papel da memoria em nossa saúde.

Muitos aspectos permanecem misteriosos na clínica. Não é incomum que os pacientes desenvolvam estranhas e desconhecidas sensibilidades aos produtos farmaceuticos e alimentícios mais comuns. Ou sujeitos que sentem súbito mal estar quando terremotos estavam para ocorrer a milhares de quilometros dali. Sabemos que muitas pessoas tem perturbações cardio-circulatórias e respiratórias antes e durante os fenomenos climáticos. Existem vários relatos de pressentimentos e sintomas inexplicáveis que normalmente não seriam relevantes para uma aplicação da técnica de tratamento, mas extremamente importantes para compreensão da história clínica de alguns individuos.

Não se trata de um fenomeno religioso ou de uma mistificação. Temos que recordar que, para a genuína investigação científica sempre existirão mais perguntas do que respostas.

O homem não é mero contemplador, de seu habitat ou de seu sistema de tratamento médico. Como todo ser vivo pertence ao ecosistema. O tempo todo age sobre ele e ao mesmo tempo sofre múltiplas influências do meio no qual habita. A meteorobiologia, uma disciplina, nos ensina o poder das meiopragias sobre os seres. Quando aumentam as manchas solares ocorrem ciclos epidemicos de doenças na Terra, as influências climáticas, barométricas e da poluição atmosférica sobre os estados de saúde são clinicamente evidentes.

Também não é infrequente que médicos sejam pegos de surpresa com o que aprendem das experiencias pessoais dos pacientes, de suas sensibilidades e caracteristicas individuais. Estar atento a estes aspectos não se limita a quem pratica qualquer modalidade de terapeutica integrativa, mas a todos que se dedicam a tarefa de cuidar da saúde dos seres humanos e dos animais.

Costumamos dizer que não há mentira em clínica. O que um paciente sente não pode ser julgado no campo estrito da verdade ou da mentira. Para atestar se um sintoma é falso ou verdadeiro não basta fazer uma investigação clínica que confirme ou não a patologia. Todos os sintomas são, de uma forma ou de outra, verdadeiros, pois mesmo as fantasias, delírios e as interpretações fazem parte integrante dos problemas dos sujeitos enfermos.

Médicos, ou qualquer profissional das práticas de saúde precisam ser treinados para acolher o que cada pessoa percebe de anomalo ou estranho no funcionamento de seus órgãos e em sua própria vida. Tudo que o paciente informa deveria ser relevante para o medico cuidador, independentemente da correlação que este estabeleça com alguma enfermidade específica. Isso vale para o generalista e o especialista, para o clinico e o cirurgião.

No mundo todo cresce uma tendência cientifica: passa a ser cada vez mais importante individualizar as doenças. Como toda uma tradição médica vitalista pensava, includindo o próprio Samuel Hahnemann é preciso saber como cada doença impacta a saúde de cada pessoa, pois cada um tem uma forma particular de desenvolve-la e de voltar a ficar saudável. Esta diretriz, preocupação constante de muitos medicos vitalistas na história da medicina, pode fazer toda a diferença.

E não só nos resultados diretos, mas em todo processo de adoecimento, convalescença e recuperação. Como lidar com o desconforto? As vezes, um tratamento pode ser dolorido e provocar sofrimento. Para a pessoa enferma é muito importante a assistência, o suporte e a presença de quem cuida. Portanto um aspecto vital de qualquer tratamento é a qualidade do cuidado que o profissional dispensa ao enfermo.

Pode-se encontrar referencias bibliograficas sobre todas as reflexões e informações. Estas reflexões são fruto de décadas de observação e testemunhos da clínica médica nos últimos 30 anos. O presente texto que o leitor tem nas mãos, ou na tela, é uma condensação de um livro, hoje esgotado, que transformei em e-book sob o título “O outro código da medicina”.

As vezes as pessoas perguntam por que diante de sua eficácia e abrangência clinica — especialmente na atenção primária à saúde e na prevenção e tratamento das moléstias crônicas — como se explica que a homeopatia nunca tenha se universalizado como forma de atendimento? Há anos a Organização Mundial de Saúde recomenda as medicinas tradicionais. Uma publicação recente da Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard[1] recomendou o uso de homeopatia nos sistemas de atenção primária à saúde. No Brasil, o SUS teve várias tentativas de ampliar o uso de práticas integrativas. Recentemente, a Suiça organizou uma consulta popular e a homeopatia finalmente entrou como opção terapeutica no sistema público de saúde. Sabe-se que ela já foi reintroduzida no curriculo de escolas de medicina nos EUA. Na Alemanha, além de popular, a homeopatia e as medicinas integrativas tem larga aceitação pelos medicos e também é usada por grande porcentagem de clínicos e especialistas como tratamento complementar. Entretanto o fato persiste: por que nunca conseguiram se universalizar como práticas médicas. Importante tentar responder por que.

São muitos fatores concorrendo simultâneamente. O primeiro e mais importante é a dificuldade para estabelecer núcleos de pesquisa que sejam financiados pelo Estado e independentes da pressão dos poderosos lobbies que comandam a indústria farmaceutica. Sem prover estes centros autonomos de pesquisa com recursos e capacidade política para determinar a prioridade das pesquisas todo avanço farmacotécnico em medicina fica sujeito à lógica dos dividendos das fábricas e sob o controle de oligopolios farmaco-industriais conforme sugeriu ainda no início do século XX o historiador da medicina Henri Sigerist. Não há nenhuma tese conspiratória ou anti-capitalista nesta observação, apenas elementar constatação de fatos. É importante reconhecer os muitos avanços das tecnologias médicas e o papel da indústria farmacêutica, ainda que isso não a transforme em um símbolo de benemerência. E é também justo que se pergunte: por que a indústria não investiria em um ramo tão promissor e potencialmente lucrativo como a de medicamentos homeopáticos que conta com centenas de milhões de consumidores?

Um dos problemas para os interesses mercantis na produção de medicamentos está no fato de que, por exemplo, as substâncias medicinais homeopáticas não têm patente, isso é, constituem um bem público. Trata-se portanto de um conjunto de medicamentos que foram incorporados ao patrimonio da humanidade, já que nenhuma indústria ou indivíduo detém os direitos de propriedade dessas substâncias. Isso significa que sobre estes fármacos não incidem royalties. Exatamente isso que você acaba de ler: nenhuma substância usada nos fármacos empregados na homeopatia possui domínio de patente. Isso explica seu relativo baixo custo. E também explica a quantidade desproporcional de ataques dirigidos contra ela e sua relativa incapacidade de responder a eles com pesquisas subsidiadas.

Evidentemente existem outras dificuldades: a natureza sectária de parte do establishment das medicinas integrativas. Numa compreensível atitude defensiva que emergiu contra as décadas de acusações de ineficácia das doses ultradiluídas, existe neste meio relutancia em fazer a autocrítica necessária para se antecipar e apontar suas próprias deficiências, lacunas e limites de atuação.

Existem praticantes que insistem numa lógica autosuficiente que clama para a medicina integrativa uma emancipação total das demais racionalidades. E também existem aqueles que aceitam abrir mão da teoria que organiza e confere alguma consistência teórica para o método. Porém para qualquer medicina de inspiração vitalista não se pode resumir os benefícios apenas ao “resultado clinico pontual”, e sim ao conunto de potenciais benefícios para a totalidade da pessoa enferma.

O dilema é compreensível: se por um lado ela se apresenta como uma outra lógica médica, por outro, ela precisa em parte assimilar-se à cultura científica corrente se quiser ser levada a sério. Isso significa que a medicina integrativa acaba falhando em se estabelecer, tanto na prática privada como no setor publico, pois não consegue nem evidenciar claramente sua performance clínica, nem se fazer entender pela linguagem contemporânea. Um impasse, que no caso específico da homeopatia, dura quase dois séculos.

O erro fundamental está numa certa recusa inconsciente destas correntes em aceitar que de uma forma ou de outra a única saída para que uma tese seja aceita nas sociedades contemporâneas é sua penetração na cultura através das pesquisas academicas e da discussão com a sociedade. Somente esse pertencimento à cultura garantiria a permanência de uma formulação sofisticada como é a proposta de uma terapeutica pautada no uso dos semelhantes.

Sofisticada, porque pretende, inclusive, retomar um assunto dos mais importantes, e, ao mesmo tempo uma das questões científicas mais negligenciadas da medicina: ainda são raras e escassas pesquisas sobre o como as pessoas se curam.

Notem que hoje já existem núcleos de pesquisa médica que discutem criticamente a validade dos protocolos padrões. O cálculo de risco para alguns procedimentos terapêuticos tem sofrido questionamentos. E uma boa parcela dos pesquisadores já leva cada vez mais a sério o fenomeno chamado superdiagnóstico[2].

As medicinas integrativas devem ser apresentadas não só como alternativas – com todas as suas conotações contra-culturais — mas como um processo que dialoga ao mesmo tempo com a ciências naturais como com as várias áreas das humanidades como a antropologia, filosofia e psicologia. Ao mesmo tempo, precisa ser mais enfática em sua proposta: estabelecer bases teóricas próprias para uma medicina do sujeito emancipada, por exemplo, das teorias psicanalíticas e das mistificações. Portanto, ela deveria ocupar o centro da discussão das ciências humanas com as ciências biológicas.

Temos tempo. Sejamos todos pacientes, a discussão está apenas começando.

[1]A Escola de Saúde Pública de Harvard e o Hospital Beth Israel, afiliado à Faculdade de Medicina de Harvard publicaram recentemente os resultados de um estudo conduzido por Michelle Dossett, MD, PhD e colaboradores incluindo o expert em placebo  Ted Kaptchuk, OMD onde concluem que os estudos conduzidos usando a homeopatia “sugerem potencial beneficio para a saúde publica como redução de uso desnecessário de antibioticoterapia, redução de custos para tratar de algumas doenças do trato respiratório melhora nas depressões relacionadas ao período do pós menopausa, melhora os resultados na saúde de indivíduos com moléstias crônicas e controle de doenças epidêmicas como por exemplo a epidemia de leptospirose em Cuba”

Homeopathy Use by US Adults: Results of a National Survey. Dossett ML, Davis RB, Kaptchuk TJ, Yeh GY. Homeopathy Use by US Adults: Results of a National Survey. Am J Public Health. 2016 Apr; 106(4):743-5.

*O outro Código da Medicina (e-book kindle)

[2] Overdiagnosed – cuja tradução poderia se aproximar de “superdiagnósticado”. Caracteriza-se em valorizar excessivamente os exames subsidiarios e atribuir importância exagerada aos disturbios clínicos que talvez não mercessem tratamento, pois seriam patologias inofensivas ou “amigáveis”. O custo orgânico e psiquico de determinados procedimentos terapêuticos são simplesmente elevados demais para os pacientes.

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O SUS e as fronteiras epistemológicas (Blog Estadão)

Destacado

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O Sus e as Fronteiras epistemológicas

“Avistar uma fronteira, é, já, ultrapassa-la”

Gaston Bachelard

Paulo Rosenbaum, PhD. Doutor em Ciências (USP) Mestre e Pós doutor em Medicina Preventiva pela FMUSP

Em resposta ao artigo “O SUS contra a ciência” dia 17/07/18 publicado na seção “Espaço aberto” de autoria de Natalia Pasternak Taschner e Alicia Kowaltowski.

O artigo de hoje das duas autoras acima trata de um tema importante, mas é de tal forma reducionista e desinformador que pode ser ele mesmo considerado como duvidoso em termos de acurácia científica. A contradição começa com o título escolhido: “O Sus contra a ciência”. Ele evoca o que há de pior em termos de maniqueísmo científico e epistemológico e trata uma questão cara à saúde pública com desleixo e uma perturbadora despreocupação com a ética. O grande mérito do artigo poderia ser trazer para a discussão os graves problemas de saúde pública, mas adotou uma abordagem confrontadora, e infelizmente o mérito potencial do nobre espaço acabou desperdiçado como um grande equivoco. Superando os problemas deste libelo anacrônico, teço, a seguir alguns comentários baseados em um dos trabalhos que desenvolvi no trabalho academico na FMUSP.

A história da medicina tem sido contada apenas parcialmente, sempre privilegiando as concepções e práticas hegemonicamente sancionadas na atualidade. Existe mais de uma outra forma racional de responder aos desafios colocados à medicina em sua trajetória histórica. O resgate da tradição empírico-vitalista, da qual a homeopatia é a principal herdeira, redimensiona essa trajetória. Esta outra versão da história nos fala do fato homeopático e das suas possibilidades para viabilizar projetos de intervenção não restritos à funcionalidade mecânica do organismo.

Se isto vem ocorrendo na práxis da biomedicina, deve-se à consciência instintiva de seus protagonistas, uma vez que a formação acadêmica não capacita os médicos para esta modalidade de intervenção. Compreende-se, então, que seus protagonistas experimentem enormes dificuldades em readaptar essa visão não mecânica a seus curricula práticos, uma vez que a pedagogia dispensada ao médico ainda centra-se substancialmente nesta única dimensão. Ou seja, há, sim, um despertar para outras dimensões do adoecer, a percepção de que este não está circunscrito ao problema biológico. No entanto, este outro modo método de enxergar e avaliar a doença e seu tratamento ainda encontra poucas condições de viabilizar-se pela carência de agentes no campo operacional.

As medicinas tradicionais entre os quais encontram-se a homeopatia, a medicina oriental, a auryveda,já foram demasiadamente castigadas e perseguidas por ideologias médicas e sistemas racionais onipotentes, cujas repercussões fizeram-se sentir na maturação de seus programas. Não se trata, porém, de uma condição especial da homeopatia e da medicina oriental. Este é um problema inerente à competição, anteriormente referida, entre programas científicos. Numa época em que a pluralidade metodológica parece arrefecer a competição entre paradigmas, algo inusitado pode estar ocorrendo: as práticas integrativas correm o risco de tornarem-se algozes de si mesmas, caso não saibam trabalhar com suas próprias contradições e reorganizar a teoria a partir do que dela emana como produto. Fica clara a completa impossibilidade de continuar a esquivar-se de interagir com as outras disciplinas e repartir este legado, herdado dos sucessivos conflitos que as caracterizaram em suas órbitas históricas.

Para tanto não basta que uma epistemologia “emprestada” de outros saberes possa corrigir as insuficiências metodológico-conceituais, mesmo que seja baseada naquilo que emerge da prática ou através das discussões teóricas. Assim, não serão os os químicos, físicos, psicanalistas, historiadores da ciência ou a tradição biomédica aqueles que trarão a luz que falta. Essa luz deverá surgir do próprio incômodo e inquietude salutar que impõe-se aos que sentem a necessidade de produzir suas evidências: os médicos que praticam outras formas de medicina. Nota-se que isto já está acontecendo e ocupando certos nichos do conhecimento, ainda que de forma tímida e pouco produtiva.

Devemos insistir na interlocução, que será difícil, assimétrica, tortuosa. Mas não é mesmo a tensão que instiga e excita o ânimo do pesquisador? Com a mesma obstinação, contudo, deve-se cuidar para que o produto inicial da interlocução venha a partir do interior, neste caso, a partir do conjunto de vivências produzidas pela própria homeopatia.

Segundo Henri Bergson (1936: 15), a “pesquisa científica é um diálogo entre a mente e os fatos”, portanto, uma construção científica é, por excelência, um diálogo referido a uma interlocução entre uma realidade eleita e uma mente disposta a percebê-la.

As práticas integrativas (recomendadas pela OMS e a OPAS como uma forma inteligente de assistência médica na atenção primária) constituem-se como um saber com aplicatio, mas são bem mais do que isto. Por acaso as autoras se deram ao trabalho de pesquisar e informar isso aos leitores deste jornal? Decerto não. O fato é que as medicinas integrativas construiram um método, um acordo intersubjetivo que vigia sua própria execução. Trata-se de uma filosofia médica (uma iatrofilosofia particular) com tradição suficientemente forte para reivindicar que suas formas de conhecer o sujeito, seu adoencimento, cuidado e cura sejam recolocadas como uma das possibilidades de teoria do conhecimento em medicina.

Se o que hoje se discute dentro dos distintos modelos científicos, tais como a teoria da complexidade e a teoria do caos, obtém status epistemológico em biologia, comparáveis mesmo ao que a teoria da relatividade ou a teoria quântica obtiveram na física, existem percepções que compõem o saber integrativo que devem perceber o valor e fecundidade de sua efetiva e positiva colaboração.

A rigor a medicina não é ciência, segundo Canguilhén a medicina já foi classificada epistemologicamente como “ciencia operativa” pois nela repousa uma quantidade incomensurável de processos complexos que não terminam quando se confecciona a prescrição, ainda idealizada como o ato derradeiro da atividade médica. A rigor, a discussão está apenas começando, uma vez que deve-se considerar a imprevisibilidade das comunicações e a imensa variabilidade de resposta dos sujeitos em suas distintas reações e respectivas idiossincrasias. Isto vale especialmente para a medicina em sua dimensão arte, quando a cada nova consulta estas comunicações se processam de um sujeito ao outro.

As medicinas integrativas precisam começar a reaprender com sua própria construção teórica, que deverá emergir de uma prática cuidadosa, que saiba, como bem diz o aforismo hipocrático, considerar que “a arte é longa, a ocasião fugidia e a experiência enganadora, o juízo difícil” (Hipócrates, 1838).

A arte é longa, porquanto tanto os comentaristas ocidentais como Hahnemann, ao invés de facilitar o trabalho e montar um sistema no qual se poderia usar o antigo sistema das nosologias para prescrever, afirmaram o valor do particular sobre o geral. “Criaram”, assim, um desafio hermenêutico nas reduções propostas pelas generalizações a partir das classificações de doenças. O cogito hahnemanniano sugere, então, que deve existir também uma nosologia do particular, do incomum, forçosamente também do impreciso. Cria uma inversão de valores, um contrapensamento, que contém em si mesmo uma das peças-chave do seu método, um problema digno de investigação para qualquer epistemólogo contemporâneo. O fato adquire aqui estatuto de idéia fecunda. Isso hoje se reflete no crescimento de medicina baseada em narrativas, a slowmedecine, a rejeição aos hiperdiagnósticos e uma orientação cada vez mais cuidadosa para o desenvolvimento de uma medicina mais individualizada.

A ocasião é fugidia já que para aprender não basta uma série de experiências mesmo que metodologizadas e organizadas. Escapa, no domínio da subjetividade do paciente, uma série de elementos fundamentais, o que automaticamente transforma em quase quimera a busca de uma inapreensível essência do sujeito. Os pacientes, assim como as substâncias medicinais, “escapam-nos” por entre os dedos, porque não somos suficientemente aparelhados para detectar o que há ali de curável e de curativo, respectivamente. O sujeito que sofre procura ajuda, alívio para seu sofrimento, qualquer ajuda pode lhe dar um suporte positivo. Muitas vezes isto pode resultar em processos transferenciais adequados, medicamentos criteriosamente escolhidos a partir de diagnósticos individuais, mas deve-se admitir que nem sempre eles são suficientes.

Os médicos debruçam-se sobre representações de fragmentos (sintomas) para cuja interpretação buscam analogias em outros (experimentações) para capturar a natureza da afecção de tipos singulares. A unidade no indivíduo é fato, mas o que muitas vezes capturamos são apenas as intermitências (sintomas e queixas) desta unidade. Quando se vê um medicamento bem escolhido agir, enxerga-se ali somente uma maior coerência entre estas intermitências. Podemos passar a perceber uma retomada da ritmicidade do conjunto. E então, na evolução clínica, pode-se observar como, para que e para onde este sujeito em reconstrução está indo. Por isso trata-se de um disparate a defesa da tese de que há uma e somente única forma correta de exercer a medicina.

A experiência é enganadora porque jamais poderemos traduzir completamente uma vivência subjetiva, como é o caso da anamnese e relação médico-pacienite, de acordo com uma assepsia metodológica. Mas de fato, como professa o primeiro aforismo hipocrático, aquilo que se conhecia até experimentar torna-se uma retradução de fragmentos de vivências que obriga o médico a comparar com aqueles que se colhe em cada consulta. E em cada nova consulta de um mesmo paciente, enxerga-se outros fragmentos, com os quais muitas vezes, entre transferências e contratransferências, se misturam médico e paciente.

O juízo é difícil porque é necessário possuir potencial e instrumental éticos suficientemente amadurecidos. Assim, pode ser preciso retroceder diante de um juízo já feito. Devemos, como um magistrado diante de um caso de múltiplas possibilidades, instruir o processo, deixando o mínimo de vestígio de nossas mãos sobre a decisão, mas sabendo que sempre restará uma margem de interpretação, de liberdade no ato de julgar. O juízo é difícil porque nossa capacidade de perceber o “sujeito-tema” resvala nas nossas próprias metáforas.

“Mas é completamente diferente com o tratamento de objetivos, cuja natureza essencial consiste de operações vitais – o tratamento, a saber, da estrutura humana viva para levá-la de uma condição não saudável para uma saudável (que é a terapêutica) e a disciplina da mente humana para desenvolver e exaltá-la (que é a educação). Em ambos os casos, o tema sobre o qual trabalhamos não deve ser considerado e tratado de acordo com as leis físicas e químicas como os metais do metalúrgico, a madeira do lenhador ou o tecido e as cores do tintureiro. É impossível, portanto, que ambos, médico e professor, quando cuidando da mente ou do corpo, devam necessitar de um conhecimento antecipado de seu sujeito-tema, que possa conduzi-lo pela mão até o término do seu trabalho, assim como obter, talvez, um conhecimento das propriedades físicas e químicas dos materiais que ajude e conduza o metalúrgico, o curtidor e outros artesões até a perfeição dos seus. A vocação de ambos demanda outro tipo de conhecimento, assim como seu objeto, um indivíduo vivo, é completamente diferente.”

(Hahnemann, sobre o valor dos sistemas especulativos em medicina, 1984: 491-492).

É verdade que nem todas as praticas integrativas são válidas e que pode haver, entre elas, práticas pseudocientíficas. Algumas, sem o olhar atento de quem deve ter formação médica, podem ser, de fato, lesivas ao paciente. Destarte as medicnas integrativas exercidas com rigor e ética tem nas mãos, em síntese, uma possibilidade concreta de intervir no sujeito, desenvolveu uma semiologia generosa, podendo interferir na maior parte das enfermidades crônicas. É claro que encontram-se algumas lacunas: insuficiência teórica, já que uma reformulação de alguns pressupostos se faz necessária; restrições do arsenal terapêutico frente à diversidade humana e a assunção das atuais limitações e dificuldades para demonstrar a ação de sua eficácia terapêutica.

Na presente ausência de estruturas hospitalares adequadas (ou serviços que ao menos aceitem-na como uma possibilidade), como viabilizar todas as opções possíveis nos casos agudos e nas emergências? Como agir coerentemente e com responsabilidade clínica frente àquelas enfermidades que requerem suporte adicional, como reabilitação, cirurgias eletivas e até mesmo drogas convencionais? Estas todas são questões que, apesar de estarem aparentemente no âmbito da prática, merecem um melhor acolhimento nas futuras discussões epistemológicas.

Outro aspecto importante é o espaço e o tempo ocupados durante uma consulta. Este “tempo” pode ser visto como um obstáculo, quando se dimensiona em que tipo de sociedade vivemos. Ao mesmo tempo, representa um positivo resgate solidário no trato entre pessoas. Trata-se de um tempo absolutamente necessário para que o terapeuta possa reconstruir a história patográfica e biográfica do paciente. Tempo também precioso para que um “outro” possa ser traduzido por si mesmo para o terapeuta. Tempo para praticar a auto-observação, consiga ele se fazer entender ou não por nós, terapeutas, seus interlocutores. Suponhamos que possamos ensinar aos médicos que se deve equiparar a destreza com o cuidado, a perícia com a suavidade, e que tanto a acurácia como a efetividade devem ser pensadas, também, prospectivamente. Por que não ensinar aos médicos que se deve, sim, atender às doenças, mas ouvindo-se simultaneamente as metáforas daqueles que as apresentam que, de maneira uníssona, reclamam cuidados e escuta.

Este pode ser um sensível “termômetro” da potencial capacidade ética e compassiva do ato de cuidar. Também representa uma enorme economia aos contribuintes já que os procedimentos são em sua maioria ambulatoriais, portanto muito menos dispendiosos e o atendimento mais pessoal e artesanal possui enorme potencial para evitar intervenções desncessárias. Além de, quando for o caso, encaminhar e triar melhor os casos que precisam de atenção mais especializada e/ou hospitalar.

Talvez, aparentemente, as medicinas integrativas como medicina do sujeito não sejam a terapêutica mais adequada à lógica das sociedades atuais onde tempo representa apenas dinheiro e poder.

Mas, talvez, isso mesmo é que faça dela uma alternativa assistencial fundamental.

https://brasil.estadao.com.br/blogs/conto-de-noticia/o-sus-e-as-fronteiras-epistemologicas/

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A penúltima volta do torniquete (Blog Estadao)

02 terça-feira jan 2018

Posted by Paulo Rosenbaum in Artigos, Na Mídia

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castelos desmoronamento, censura ao Jornal O Estado de Sao Paulo, contodenoticia blog, eleiçoes 2018

Um adulto e uma criança brincavam juntos à beira mar. A areia molhada de praia foi pingando e se acumulando no topo de um castelo pacientemente erguido grão a grão.
O filho perguntou ao pai: Ele vai desmoronar?

Quem sabe quando a opinião pública se fizer ouvir? Quando saírem do mundo virtual e filiarem-se às ruas? Ou quando entrarmos em alienação?

Não uma qualquer, refiro-me à catatonia aguda. Uma que nos impeça de considerar atos ilícitos como naturais.

Quem sabe um anestésico indolor que não nos faça enxergar o que acontece com os outros?

No País da hermenêutica fácil, qualquer um fala com propriedade nas plenárias. Ou, quem sabe ocorre algum milagre monocrático de final de ano?

O Congresso também pode reunir-se em sessões suplementares sem jetons para ler, em jograis, a Magna Carta? E então aprender a lição do Rei John, que em 1215, teceu sua ode civilizatória.

Segundo o Rei bretão igualdade perante a lei não é, nunca foi, metáfora poética. É o fundamento do legislador.

Quem sabe considerar que não faz sentido o Estado de Direito transformar-se no interminável Estado de Deveres? Que os escravos da joint venture Estado & funcionários é que merecem o descanso sabático, a desoneração, e o direito de voltar para casa vivos?

Que os partidos deixaram de fazer parte do metabolismo dos cidadãos para virar corpos estranhos. Que há uma diferença fundamental entre patriotas e nacionalistas? Entre os indignados por justiça e os coléricos contra ela?

Que os juízes, em seus leitos de morte, também terão suas consciências devassadas? Que os confiscadores serão, eles também, confiscados? Que quem aceita urnas inauditáveis será obrigado a aceitar candidatos idem?

Que a vida de um País não pode ser interrompida por sucessões de manchetes enganosas? Que as manchetes enganosas não refletem o estado de espírito de quem precisa de informações verdadeiras.

Que exceder funções é assinar um procurador geral em branco. Que não há mais quem acredite em justiça estratégica. De que as epifanias de Brasília não são as nossas.

De que a relativização levada ao paroxismo gerou para além das fake news, um fake world. Novas que se sucedem pagas com dinheiro que já foi público. E não há nenhuma solução que seja ao mesmo tempo rápida e indolor.

Que bandidos enraizaram sua moral por todas as plantações? E não queriam colher trigo. Nunca pensaram em gerar sementes saudáveis. Qualquer erva daninha dava voto, então por que a preocupação? O desejo por veneno é tão presente que os antídotos nem sequer estão sendo considerados.

O vislumbre e a expectativa de muitos é regredir a um Proto País, policialesco e intolerante. Por outro lado, a justiça passou por todas as provações e quem dirá, hoje, que nela se pode confiar?

O atual status quo não tem nada de espontâneo. Foi elaborado como plano C. O jornal O Estado de São Paulo, por exemplo, no seio da ficção das garantias constitucionais que se chama “liberdade de expressão’ encontra-se censurado há 3.000 dias. A solução? Para não consentir usar a palavra “censura”recorreu-se à tarda decisão. Sob o manto de pedidos de golpe de vista.

Só eu me comovo quando a linguagem eclipsa a distorção? E referenda o que o consenso de magistrados e cúpulas decidiu que não pode ser dito? Que um terrorista não atende por outros nomes a não ser inimigo público da humanidade? Há uma guerra que, espremida dentro dos bastidores, faz vazar o mal feito e agora tinge a sociedade com desonras e confusão.

O torniquete está em sua penúltima volta, e o sangue pode parar de fluir a qualquer momento. As cidades estão pálidas, perdendo vitalidade para assassinos imunes. Sob gritos de socorro os cidadãos secam sob as duas mais violentas máquinas de tortura: descaso e impunidade.

O establishment fez sua escolha: o indefensável está solto e em plena campanha. Promete que ele e sua casta serão preservados junto com a garantia de foro para manter o patrimônio conquistado com o suor da dilapidação do erário.

E quem tolhe o populista que oprime? Quem interdita a omissão dos poderes? Pseudo heróis afirmam que o crime não é tudo: depende muito mais de quem o comete. O disparate é popular. A compaixão, seletiva. O abuso, consumado e bem divulgado nas redes.

A tiragem dos jornais lacrada pelos interesses. Fábricas de intenção de voto. Pesquisas direcionadas patrocinam o aumento da aprovação enquanto a lei eleitoral vive de recesso. O gesso expande-se contra a liberdade. Os jornalistas esmagados pelos patrocinadores.

Mas, calma leitor.

Talvez este não seja o fim da história como certa vez quis o acadêmico de Harvard, desmentido e reprovado a golpes do imprognosticável quando as torres vieram ao chão. Podemos desmentir tudo, por um único motivo: o imprevisível faz suas visitas regularmente. Revoluciona sem alarde, com a mais implacável simplicidade.

Como o médico que chega e, sem se intimidar com a pressão por medidas drásticas, apenas abre as janelas para arejar o quarto sufocante. Existem portões que são escancarados por ventos oblíquos, marés que transtornam encouraçados e gente com potencial para chacoalhar uma sociedade letárgica.

Salvar uma jovem democracia da morte súbita requer o Estadista que ainda não apareceu. Não será fácil, e decerto será longo, mas, às vezes, basta um caso. Um único caso tem potencial para remover qualquer paradigma (ou candidato) apodrecido na linha da história. O trilho está colocado, os vagões posicionados.

Mesmo sem maquinista a história costuma dirigir rápido e seus efeitos são mais efetivos que os discursos sobre ela. Em meio às instituições obsoletas guiadas pelo corporativismo, a entropia se acelera. Se vai ser locomotiva, trem bala, Maria Fumaça, ou apenas o colapso em todas as estações ninguém pode prever.

Por hora só há uma certeza, na disciplina engenharia de materiais existe um ponto crítico de desabamento, desencadeado por qualquer grão extra: é assim que, no percurso do tempo, muitos castelos não pararam em pé.

– Filho, viu? Acaba de desmoronar.
– Então de que adianta fazer se vai cair?
– Porque é assim mesmo, precisamos continuar.
Hesitante, o menino levanta e medita por alguns instantes antes de responder:
– Podemos começar outro?

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A Mentalidade Preventivista (blog Estadão)

06 segunda-feira fev 2017

Posted by Paulo Rosenbaum in Artigos, Imprensa, Na Mídia, Pesquisa médica

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blog conto de noticia, boite kiss e a justiça, conto de notícia, filosofia, holocausto, Literatura, Mark Twain, medicina e acaso, mentalidade preventivista, tarda justiça

Era para ser um texto em homenagem ao aniversário desta cidade. Não deu. Pois lá se vão quatro anos do incêndio da boate Kiss e a tarda justiça ainda continua fazendo vítimas em série. Em homenagem às famílias, aos que não podem mais se defender da inépcia do Estado e para que — em algum futuro tremendamente remoto — tragédias anunciadas, disfarçadas de fatalidade, não voltem a ocorrer republico no blog, excepcionalmente, o texto “A Dor merece nosso Constrangimento”. Decerto que o imponderável, o imprognosticável,  a  incerteza e o absurdo são tanto perturbadores, como onipresentes na condição humana. Porém, isso não tem nada a ver com pane seca, falta de extintores, erros de cálculos em pontes e viadutos, falha na inteligência, justiça leniente, leis anacrônicas, cárceres inimagináveis, descaso com áreas de risco, e, finalmente, déficit de vigilância para cuidar que as instituições não sejam escravas das corporações.

Que a mentalidade preventivista se infiltre em quem governa. E, se não, — que as consequências desta falta crônica desabem sobre os omissos, mostrando que quem quer gozar do Poder, quem precisa do Poder, quem está obcecado por ele, tem a obrigação, moral ou criminal, pouco importa, de planejar e, sobretudo, a responsabilidade de antecipar acontecimentos.

 

A dor merece nosso constrangimento

 

Devo estar cultivando a insensibilidade, já que não me comoveu o choro nem a circunspeção dos políticos nos funerais. Além disso, temos que suportar o horroroso espetáculo dos apresentadores explorando a biografia das vítimas ou especialistas explicando como os alvéolos são destroçados pela inalação de fumaça. Nesse campo de batalha, só cabem urros, uivos, ritos de contrição. A dor merece nosso constrangimento.

São poucas ou muitas as palavras que podem descrever acuradamente o absurdo. Absurdo é pouco, estultilóquio, limitado, dislate, distante. Precisava de um vocábulo sem precedentes. Pois “galimatias” revela um glossário analógico apropriado para o desastre gaúcho: um acervo de heresias e incoerências disparatadas, coxia de desconchavos, parvoíce chapada, um amontoado de cacaborradas, aranzel, inépcia, chocarrice. Para contornar registros menos recomendáveis ao grande público, cada um deles pode indicar o repertório que se passa pelas nossas cabeças quando tragédias completamente evitáveis parecem inevitáveis.

A falta de decência não é só fazer as coisas sem pensar que outros podem se ferir ou sair lesados. Paira no ar um senso de desproporção, tocado pelo culto ao único mito invicto de nossa era: grana.

Há uma máxima que deveria vir instantaneamente à cabeça de qualquer um: “Tratarei todo filho como se fosse meu”. Passa longe do sentimento predominante. Que dizer dos donos do lugar e dos homens da segurança? Inicialmente, sem perceber a eminente tragédia, impediram pessoas de sair do inferno. Quais as regras a serem seguidas e quais merecem desobediência civil já?

Não sei quantos mais poderiam ter sido salvos da asfixia, da carbonização. Uma vida poupada teria feito toda diferença. Mas havia a barreira do execrável pedágio, a pirotecnia fora de lugar, o entupimento das salas, as formigas espremidas na armadilha.

Não vem ao caso apontar para a banda ou para os proprietários como alvos óbvios de punição e responsabilização criminal. Já que pais e mães tiveram seus futuros cassados, e as vítimas ardem na sombra, seria preferível acompanhar o que o poder público tem a dizer.

Em geral, fiscais são bons burocratas e, raramente, têm consciência de seu papel vital na prevenção dos desastres. Prevenção, lugar-comum, baixa visibilidade, antipopular, mas a única palavra-chave para não termos que ouvir a esfarrapada desculpa “fatalidade”. Isso não é um se, está acontecendo agora. Nas enchentes, na calamidade absoluta que é a segurança pública do país, na incapacidade organizacional para gerir o dia a dia das cidades. A verdade é que, se ainda vivemos ilesos, é por sorte e apesar do Estado. E não se trata de apontar para um único partido. Todos comungam deste mínimo múltiplo comum, a incapacidade de enxergar que toda matéria política caberia numa sentença: governo é para o povo. Submergidos no populismo ignorante, cosmético e estelionatário, quanto dinheiro ainda será arrecadado nas miríades de impostos pagos para fiscalizar e manter as bocas de lobo, as escolas, o passeio publico, a segurança, a defesa civil? E como isso será gasto? Não sabemos e ninguém sabe.

Mark Twain escreveu: “O governo é meramente um servo, meramente um servo temporário: não pode ser sua prerrogativa determinar o que está certo e o que está errado, e decidir quem é um patriota e quem não é. Sua função é obedecer a ordens, não originá-las”.

Só quando os administradores forem imputáveis e sentirem nos bolsos e na privação de liberdade que, se falharem em prevenir o prevenivel sofrerão consequências pesadas, talvez tenham mudanças efetivas no dislate que é o planejamento público no Brasil. Só quando a opinião pública exigir que as apurações não se limitem a dois ou três bodes expiatórios, mas, a quem, de fato, permitiu a vigência do absurdo. Talvez ai, calçados na educação solidária, o respeito aos cidadãos conquistará status de lei.

Na hora dos massacres, a solidariedade autêntica vem das pessoas desvinculadas do poder. Emerge pura da nossa emoção, premida pelo nada, esvaziada de sentido, e lapidada pela voz rouca do abandono. Um sobrevivente do incêndio descreveu “Vi o monte de corpos empilhados uns em cima dos outros, como os judeus no Holocausto”. Ainda que o cenário justifique a analogia, a outra semelhança é a gratuidade com que essas vidas foram incineradas.

Todos nós, civilizados desde o berço, podemos enxergar tragédias como inerentes à condição humana. Rachaduras na placa continental, asteroides, furacões e terremotos são eventos inevitáveis, às vezes inexoráveis. Crematórios, não. A dor merece nosso constrangimento, assim ao menos sofreremos todos juntos. Não entendo bem por que, mas parece que precisamos nos derreter para nos unirem.

Paulo Rosenbaum é médico e escritor. É autor de “A Verdade Lançada ao Solo” (Ed. Record) e “Céu Subterrâneo” (Ed. Perspectiva)

paulorosenbaum.wordpress

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Resenha Crítica de Céu subterrâneo Por Cíntia Moscovith – Jornal Zero Hora

03 quarta-feira ago 2016

Posted by Paulo Rosenbaum in Artigos, céu subterrâneo, Livros publicados, Na Mídia

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Adam Mondale, céu subterrâneo, Cíntia Moscovith, Editora Perspectiva, Israel, Jacó e Gita Guinsburg, Makhpelá, Resenha Crítica Literatura, Verdade lançada ao solo

Cíntia Moscovich: Debaixo da terra

A colunista escreve quinzenalmente no 2° caderno

01/08/2016 – 06h04min | Atualizada em 01/08/2016 – 06h04min
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Protagonizado por Adam Mondale, um autor em crise que ganha uma bolsa para viajar a Israel e escrever um romance, a trama se escora nos mistérios que envolvem a gruta de Makhpelá, o Túmulo dos Patriarcas da tradição judaica – daí o “céu subterrâneo” do título –, local que Abraão teria comprado para sepultar Sara e onde estariam enterrados o próprio Abraão, Isaac, Rebeca, Jacó e Lia.

Veja também:
Cíntia Moscovich: Vade retro
Cíntia Moscovich: A rotina do artista

De posse de um velho negativo de máquina polaroide, com o aluguel de um apartamento feito pela Internet, Mondale chega a Jerusalém numa madrugada fria e chuvosa. Ao procurar o endereço, se descobre enganado – e essa é a primeira peripécia da história. A partir daí, o livro se desenvolve em três planos: a aventura em Israel, a construção do romance e o descobrimento pessoal do personagem – inclusive de um misticismo rechaçado mas inescapável. Com tons kafkianos e metalinguísticos, a trama se apresenta com a cronologia alterada, cabendo ao leitor organizar a sucessão dos fatos no tempo.

Dono de uma prosa envolvente, embasada num extenso conhecimento da matéria, Rosenbaum, que é também autor de A verdade lançada ao solo (2010), cria um clima labiríntico, no qual a tensão é alimentada por cortes precisos e informações que surgem em momentos cruciais da narrativa.

Ademais das virtudes inerentes, Céu subterrâneo tem ainda a chancela de uma das respeitadas casas editoriais do país, que completa 50 anos sob o comando de Jacó e Gita Ginsburg. Responsável pela coleção Debates, a Perspectiva publica uma vastíssima gama de assuntos, tendo participado diretamente na formação intelectual (e afetiva) de todos os brasileiros que se debruçam sobre as humanidades. O selo é certeza de edições de qualidade – como é, sem dúvida, o caso de Céu subterrâneo.

http://zh.clicrbs.com.br/rs/entretenimento/noticia/2016/08/cintia-moscovich-debaixo-da-terra-7040569.html#

 

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Pessach e Páscoa : libertem as idiossincrasias (blog Estadão)

03 sexta-feira abr 2015

Posted by Paulo Rosenbaum in Artigos, Imprensa, Na Mídia

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idiossincrasias, Páscoa, pessach

Paulo Rosenbaum

03 abril 2015 | 17:19

Pessach e Páscoa: libertem as idiossincrasias

idiossincrasiaII

Alguns dias são mais díspares que outros. Hoje é um deles. Reparem nos poetas alienados, nas alegrias infundadas, nos sonhos para um final.

Nossa única constância vive de travessias infindas, na carne esquecida, nas mortes mitigadas, na resistência das cascas de ovos sem fim, num mundo sem rugidos nem gemidos.

Abram alas: precisamos de espaço, ideologias e seus mentores que esperem, enfim nossa vez de passar. Nós merecemos dizer o que queremos, exigir o que desejamos, mostrar ao que viemos. A passagem pode não ter beira nem margem, pode não acrescentar beleza nem coragem. Tudo passa, limbo e muro, enquanto a vida insiste, futuro.

Se sobrou qualquer significado para as tradições? Recobrar sentidos que pedem expressão, presença de símbolos que isolam certezas. Hoje é dia ideal para cabeças feitas, desfeitas. Mesas postas na nova ordem. Sequencias sem ritual, formas sem apego, ritmos sem hiatos. Religiões e não religiões. As idiossincrasias são sagradas,  são elas que podem nos restituir a união.

Na paz permanentemente adiada, acordos podem ser pesadelos.  E desacordos são lá uma alternativa? Hoje é o dia no qual as regras foram abolidas, réguas desprezadas, tréguas assimiladas. Nenhuma paz será derradeira mesmo que todos os sonhos sejam roubados por guerras rejeitadas.

O dia cuja passagem tornou-se permanente. No qual presidentes falam baixo, juízes benévolos, juízos perfeitos. Na travessia, a infância dos homens transformou nossas retinas para sempre. Apagou-se o fosco do céu. Impeliu brilho aos confins. Para que o Cosmos ajeitasse as coisas eis o dia da leniência abstrata. Da pax correlata. Da vigência temporária. Da flexibilidade originária. Coacervados mudos e algas falantes, evolução errante. Campos que alimentam as raças.  Animais mutantes e homens persistentes.

Hoje, dia das faunas mistas. Das concretudes explicitas. Das mulheres sem dono. Dos radicais enjaulados. Da democracia para espíritos. Da incontinência dos libertários. Das conchas radiofônicas. Da velhice jovial. De palcos cordiais. Da derrota do inevitável.

Hoje, a tragédia foi abolida. Desvelada a calçada até a utopia, suspendam toda política. A razão da liberdade invadiu toda análise. Eis o dia em que a casa arderá com convívios. A noite da refeição direta. Diante da uva transformadora. O dia da interlocução como único valor. O momento da síntese Eterna.

Não importa como acordaremos: este é o dia.

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E agora Dinamarca? (blog Estadão)

15 domingo fev 2015

Posted by Paulo Rosenbaum in Artigos, Na Mídia

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alvos judaicos, atentando terrorista na Dinamarca, cobertura logística, Dinamarca, escritor nativo, jihadismo internacional, Obama e os ataques "randomicos", Paris

E agora, Dinamarca?

Paulo Rosenbaum

15 fevereiro 2015 | 04:50

terrorXX

Outra vez. Desta feita o jihadismo atingiu a Dinamarca. De novo, balas caçam quem defende a liberdade. Muita gente grita, mas por que será que as vozes se enfraquecem precocemente? A marcha de Paris já ficou anacrônica. Prevalece o silencio seletivo, aquele que reforça a inação, o conluio involuntário com a intolerância. A violência se expande sem margens definidas. Há uma vergonhosa recaída na velha e ofensiva fórmula de abafar a crise. E eis que ela já é continental.

Há poucos dias pode-se ler de um escritor nativo que o Ocidente é que precisava repensar suas barbáries. E quem discorda? Mas ele seguiu imodesto acusando a Europa de ser a produtora serial de monstruosidades. As cremações in vivo, as crucificações, estupros, escravização de infiéis e as degolas do neonazismo em nome de algum califa não passavam de detalhes da história. Pois, em oposição, considero seriamente todos os detalhes. A história não pode ser julgada como um só bloco. Sem contexto tudo parece mais do mesmo. As vezes não é.

Tentando conter a pressão e ao mesmo tempo rechaçando comparações que julgaram desproporcionais, assessores do presidente norte americano afirmariam que o estado islâmico não representa — como a aventura nazista na segunda grande guerra — uma ameaça existencial. Depende. Para quem? Obama complementou o discurso afirmando que a escolha de alvos judaicos para desferir os recentes ataques na França eram apenas “randômicos”: questão de sorte, cara ou coroa, impulso de momento. Pois não são, nunca foram.

Kopenhagen repete, por atuação quase mimética, a epidemia de lobos solitários que vai se tornando rotina nas cidades europeias. Bélgica, Toulouse, Paris e agora a capital da Dinamarca. Imitam as mesmas configurações da capital francesa, e os terroristas ainda à solta. É provável que sejam capturados. Podem ser mortos em confrontos com a polícia ou sair da Europa com a cobertura de quem lhes forneceu armas, financiou a jornada e ofereceu cobertura logística.

Mas, e as ações preventivas? Aquelas que vieram depois dos feitos dos milicianos de Paris – pois ainda é assim que a eles se referem, combatentes para aqueles que enxergam nos assassinos algum resquício de causa justa – foram obras da inteligência e da polícia. Mas e a sociedade? Qual a força e rigor necessários para responder à terra de ninguém, quando os roteiros homicidas estão sendo traçados? Como aceitar que o radical inspirado por religião, ideologia, ou pela mistura confusa de ambas, conserve a liberdade de organizar ações que determinariam o fim desta mesma liberdade? Monitoramento de bilhões de telefonemas, vigilância de drones e a aposta tecnológica não tem sido nem suficientes, nem eficientes, para romper a convocação de guerreiros santos via web. Voluntários, vindo de várias partes do mundo chegam todos os dias às bordas da fronteira Síria.

Não enxergamos que por trás do evidente, vivem os detalhes. Aqueles que enganam com sua falsa obviedade. A convocação que arregimenta gente pelo mundo é a consagração de uma busca inalcançável. Para além das virgens e da confirmação instantânea de bem-aventurança, está também uma profunda decepção com os valores do materialismo. Paradoxalmente cultuado com carreatas de máquinas potentes, cavalos de pau nos tanques chineses, e a última palavra em fuzis russos, a ideia ali é uma confluência onde estão abolidas outros contratos sociais e só vale a palavra morta das leis teológicas. Precisam nos convencer, por bem ou por mal. (como se constata o bem foi estratégia logo descartada).

Isso tudo não é o suficiente para retirar o caráter doutrinário da islã radical que impregna e recheia a nova epidemia. A escolha de minorias é um fato essencial. Ninguém com algum poder crítico deveria cair na armadilha de traçar qualquer equivalência moral com outras guerras e conflitos em curso. Por sua vez a eleição de alvos judaicos tem um caráter duplo: é a mais infame, e ao mesmo tempo a mais naturalizada das perseguições.

A diferença entre um ateu que mata e o devoto que atende um chamado divino é auto evidente. Como também é notável a distinção entre a eleição calculada de alvos civis e os danos colaterais de uma guerra. Se um Estado exagera pode ser responsabilizado. Se um partido pula a cerca pode ser, à duras penas, chamado à justiça. Mas, se grupos anônimos e transnacionais se disfarçam de lobos solitários para fazer o que bem entendem, caminham à inimputabilidade. Suas ações se assemelham aqueles das turbas linchadoras, onde ninguém é capaz de definir quem é quem e menos ainda quem aplicou o golpe derradeiro.

É importante admitir que o terror já é uma força triunfante. Mudou a cultura e os hábitos de bilhões. Não bastasse todas as inseguranças que as pessoas vivem em seus cotidianos, o pânico extra, gerado por ações cada vez mais sistemáticas, obriga os cidadãos a operar sob o medo. E o medo é uma força desorganizadora, inclina o sujeito à hostilidade e ao desespero. No recuo, no recolhimento que a paúra provoca, estamos com o pé atrás. Quanto tempo a civilização concebe suportar becos sem saída?

E agora, Dinamarca?

Tags: arregimentação de jihadistas via web, atentado em Kopenhagen, estado islâmico, guerra santa, materialismo, Obama e os ataques “randômicos”

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